Gostaria de iniciar lembrando de Sérgio Buarque de Holanda, importante historiador brasileiro. Autor de obras primas como "Raízes do Brasil" e "Visão do Paraíso", dentre outros títulos. Foi o citado professor quem cunhou o termo "homem cordial" para se referir ao brasileiro.
Muitos interpretaram erradamente que "homem cordial" se referia à visão que o estrangeiro, daquele tempo, construía do povo brasileiro. Uma gente alegre, faceira, hospitaleira, gentil e que recebia a todos de braços abertos. Porém, não era bem isto a que se referia a inteligência do historiador ao formular a expressão.
Na verdade, o autor se referia ao modelo de relações que se desenvolveu no país no que tange os interesses públicos e privados. Considera que o brasileiro age na esfera pública com as mesmas categorias da esfera privada ou familiar. Inclusive, a partícula "cor", de cordial, é relativo a cor-ação (coração). Por isso, nosso político age com o "coração" ao revés de agir de acordo com os interesses públicos e sociais. Por exemplo, nomeando um parente para um cargo no lugar de um técnico experiente no assunto. Deste contexto derivam relações como o compadrio, que é muito estudado na formação social e política nacional.
Por outro lado, há autores que também alegam que o homem comum, que sofre as consequências dessa deformação do homem público, também é cordial no momento que aceita e recebe tais práticas com passividade, mas quando consegue um posto de poder acaba reproduzindo as mesmas ações e discursos. Assim, ambos se encontram no mesmo lugar cultural.
E de lá para cá não mudou nada para melhor. O nepotismo, por exemplo, continua sendo algo muito comum no setor público. Mas não é muito diferente no privado, quando tantos filhos de artistas tem o seu lugar assegurado no show business. Na política dos palácios, o dinheiro público continua sendo tratado como bens particulares.
Enquanto isso, na cabeça do brasileiro, nos mais diversos estratos sociais, os valores éticos e morais vão derretendo. Muito já foi discutido sobre a aceitação geral que teve a frase "eu quero é levar vantagem em tudo", proferida em um antigo anúncio de cigarros pelo garoto propaganda que era um dos craques da seleção de 70. O simbolismo desta peça publicitária foi enorme. A seleção de futebol é um dos principais elementos sobre o qual repousa uma consciência de nacionalidade no país. Se o craque da seleção diz que temos de levar vantagem em tudo, isto ganha uma força enorme no imaginário. Ainda no plano do futebol, vimos a mentalidade média evoluir para concluir que "ganhar roubado é mais gostoso".
E neste sentido, as relações humanas vão se deteriorando cada vez mais neste pedaço do globo..
Vou narrar algo insólito que ocorreu comigo. Já faz um bom tempo que em minha residência, que fica num prédio de apartamentos em Maceió, sofremos constantemente durante o horário noturno e madrugada com barulhos que causam a interrupção do sono. Como dá para perceber pela audição de qual unidade vem o barulho, já pedi várias vezes ao porteiro, durante o horário noturno, para ligar no interfone do imóvel para pedir que cesse o ruído. Apesar das várias ligações do porteiro, não adianta. Na noite seguinte retornam as pancadas e móveis arrastando novamente. Trata-se de um inquilino que eu nem conhecia pessoalmente. Apesar dele já estar à mais de um ano no prédio. O porteiro relatou que era um rapaz novo e tal. Então, um dia que entrei no elevador havia uma figura dentro que se assemelhava com o perfil descrito pelo porteiro. Eu perguntei se era o morador do apartamento número tal. Ele disse que sim. Então me apresentei e com toda tranquilidade e a maior didática possível, própria dos egressos dos cursos de licenciatura, expliquei o que estava ocorrendo. Ainda explanei sobre a estrutura do prédio, que por ser antigo não há uma camada de material isolante entre as lajes, falei sobre o piso de pedra que reverbera o som totalmente para o andar abaixo e etc. O sujeito disse que não sabia que passava tanto som assim (apesar de tantos meses com o porteiro ligando à noite) e que ia arrumar uns tapetes e tal. Nos despedimos e não nos encontramos mais. Depois de um tempo, o sujeito escreve no livro de registro do condomínio que se sentiu agredido e coagido por mim ! Dá pra entender uma trambicagem dessa ? Aliás, se tem alguém sofrendo agressão nessa história é quem deseja dormir e não consegue.
Antigamente, a gente se portava perante os outros segundo o princípio de que todo mundo era de boa-fé até que se prove o contrário. Agora tem que ser ao contrário ! Para falar qualquer coisa com alguém é bom levar testemunhas junto !
Isso aconteceu no ambiente do prédio residencial, mas poderia ser em qualquer outro lugar. Que fique a dica para os professores. Evitem também falar com alunos de forma separada. Sempre fale na presença de outros. Não fique após a aula na sala atendendo sozinho algum aluno e nem na sala de professores. Sempre tenha testemunhas por perto. Se algum aluno te parar para falar em algum lugar sem mais pessoas diga que precisa ir no banheiro e saia fora. Nunca se sabe quando um potencial futuro psicopata vai inventar uma história maluca sobre você.
A minha pergunta é até onde a falência de nossas instituições (executivo, legislativo e judiciário) está ajudando a formar gerações de canalhas. Gente que acha que pode inventar qualquer estória para se dar bem.
Participe do grupo prophisto história geral & Brasil no facebook:
https://www.facebook.com/groups/prophisto/
Muitos interpretaram erradamente que "homem cordial" se referia à visão que o estrangeiro, daquele tempo, construía do povo brasileiro. Uma gente alegre, faceira, hospitaleira, gentil e que recebia a todos de braços abertos. Porém, não era bem isto a que se referia a inteligência do historiador ao formular a expressão.
Na verdade, o autor se referia ao modelo de relações que se desenvolveu no país no que tange os interesses públicos e privados. Considera que o brasileiro age na esfera pública com as mesmas categorias da esfera privada ou familiar. Inclusive, a partícula "cor", de cordial, é relativo a cor-ação (coração). Por isso, nosso político age com o "coração" ao revés de agir de acordo com os interesses públicos e sociais. Por exemplo, nomeando um parente para um cargo no lugar de um técnico experiente no assunto. Deste contexto derivam relações como o compadrio, que é muito estudado na formação social e política nacional.
Por outro lado, há autores que também alegam que o homem comum, que sofre as consequências dessa deformação do homem público, também é cordial no momento que aceita e recebe tais práticas com passividade, mas quando consegue um posto de poder acaba reproduzindo as mesmas ações e discursos. Assim, ambos se encontram no mesmo lugar cultural.
E de lá para cá não mudou nada para melhor. O nepotismo, por exemplo, continua sendo algo muito comum no setor público. Mas não é muito diferente no privado, quando tantos filhos de artistas tem o seu lugar assegurado no show business. Na política dos palácios, o dinheiro público continua sendo tratado como bens particulares.
Enquanto isso, na cabeça do brasileiro, nos mais diversos estratos sociais, os valores éticos e morais vão derretendo. Muito já foi discutido sobre a aceitação geral que teve a frase "eu quero é levar vantagem em tudo", proferida em um antigo anúncio de cigarros pelo garoto propaganda que era um dos craques da seleção de 70. O simbolismo desta peça publicitária foi enorme. A seleção de futebol é um dos principais elementos sobre o qual repousa uma consciência de nacionalidade no país. Se o craque da seleção diz que temos de levar vantagem em tudo, isto ganha uma força enorme no imaginário. Ainda no plano do futebol, vimos a mentalidade média evoluir para concluir que "ganhar roubado é mais gostoso".
E neste sentido, as relações humanas vão se deteriorando cada vez mais neste pedaço do globo..
Vou narrar algo insólito que ocorreu comigo. Já faz um bom tempo que em minha residência, que fica num prédio de apartamentos em Maceió, sofremos constantemente durante o horário noturno e madrugada com barulhos que causam a interrupção do sono. Como dá para perceber pela audição de qual unidade vem o barulho, já pedi várias vezes ao porteiro, durante o horário noturno, para ligar no interfone do imóvel para pedir que cesse o ruído. Apesar das várias ligações do porteiro, não adianta. Na noite seguinte retornam as pancadas e móveis arrastando novamente. Trata-se de um inquilino que eu nem conhecia pessoalmente. Apesar dele já estar à mais de um ano no prédio. O porteiro relatou que era um rapaz novo e tal. Então, um dia que entrei no elevador havia uma figura dentro que se assemelhava com o perfil descrito pelo porteiro. Eu perguntei se era o morador do apartamento número tal. Ele disse que sim. Então me apresentei e com toda tranquilidade e a maior didática possível, própria dos egressos dos cursos de licenciatura, expliquei o que estava ocorrendo. Ainda explanei sobre a estrutura do prédio, que por ser antigo não há uma camada de material isolante entre as lajes, falei sobre o piso de pedra que reverbera o som totalmente para o andar abaixo e etc. O sujeito disse que não sabia que passava tanto som assim (apesar de tantos meses com o porteiro ligando à noite) e que ia arrumar uns tapetes e tal. Nos despedimos e não nos encontramos mais. Depois de um tempo, o sujeito escreve no livro de registro do condomínio que se sentiu agredido e coagido por mim ! Dá pra entender uma trambicagem dessa ? Aliás, se tem alguém sofrendo agressão nessa história é quem deseja dormir e não consegue.
Antigamente, a gente se portava perante os outros segundo o princípio de que todo mundo era de boa-fé até que se prove o contrário. Agora tem que ser ao contrário ! Para falar qualquer coisa com alguém é bom levar testemunhas junto !
Isso aconteceu no ambiente do prédio residencial, mas poderia ser em qualquer outro lugar. Que fique a dica para os professores. Evitem também falar com alunos de forma separada. Sempre fale na presença de outros. Não fique após a aula na sala atendendo sozinho algum aluno e nem na sala de professores. Sempre tenha testemunhas por perto. Se algum aluno te parar para falar em algum lugar sem mais pessoas diga que precisa ir no banheiro e saia fora. Nunca se sabe quando um potencial futuro psicopata vai inventar uma história maluca sobre você.
A minha pergunta é até onde a falência de nossas instituições (executivo, legislativo e judiciário) está ajudando a formar gerações de canalhas. Gente que acha que pode inventar qualquer estória para se dar bem.
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Parabéns pela iniciativa do texto, bastante proveitoso...
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