Dentre as muitas crises instaladas atualmente no Brasil, uma delas é a crise da renovação de referências intelectuais nos mais diversos ramos do conhecimento. Isto acontece notadamente na área das ciências humanas.
Temos sentido muito a perda de nomes como Darcy Ribeiro, Antônio Cândido, Caio Mário da Silva Pereira, Celso Furtado, Sérgio Buarque de Holanda, entre tantos outros que se foram nas últimas décadas. E as atuais referências de grandes pensadores sobre o Brasil e a nossa época estão circunspectas a alguns nomes midiáticos da academia. Não queremos desmerecer a atividades de tais professores que mereceram a janela da grande mídia. Contudo, será que esta preferência midiática é fundada em obras acadêmicas que realmente sustentam inovadoras construções interpretativas? Ou se baseia tão somente numa oratória de fácil digestão pelo grande público?
Curiosamente, hoje, perdemos referências intelectuais na mesma proporção em que crescem exponencialmente o número de artigos científicos, dissertações e teses guardadas nos bancos e arquivos acadêmicos.
Uma das tentativas de se explicar este fenômeno reside na própria formatação atual da carreira acadêmica que leva a uma aguda especialização dos pesquisadores. Quanto mais se exige esta super especialização, menor é o poder de visão global do estudante. Assim, ficamos naquele impasse entre a graduação, que significa saber pouco sobre diversos temas, e a especialização, que é saber muito sobre poucas coisas. E do jeito que segue, muito brevemente os especialistas saberão muito sobre quase nada! Provavelmente, temos que chegar a um meio termo nesta equação.
Outro problema é a sobreposição que o mercado teve em relação à vida acadêmica nas últimas décadas. Por algum tempo a academia lutou para ser um ambiente autônomo em relação aos sabores do mercado. E ainda luta hoje em dia. Contudo, as exigências do mercado foram penetrando e alterando as relações acadêmicas. Um exemplo claro é o setor de pesquisa super inchado de alunos a partir do momento que o mercado passou a exigir cada vez um leque maior de atividades de pós graduação para garantir chance de empregabilidade. Desta forma, houve uma grande corrida para os cursos de pós graduação. A pesquisa não era mais o fim em si mesmo, mas a obtenção do título. A publicação de artigos deixou de ser a mera consequência do resultado de um trabalho de anos de pesquisas para ser um imperativo para os estudantes e pesquisadores. Quanto maior o número de referências a artigos acadêmico publicados, melhor para o currículo Lattes. Neste sentido, a filósofa Marilena Chauí, ao criticar este modelo, disse com propriedade que "a vida não cabe no Lattes".
Desta conjuntura surgem fenômenos como a chamada coautoria fantasma. Que não se trata de ocorrência de atividade paranormal nos centros de pesquisa, mas da manifestação do 'jeitinho acadêmico" para rechear o currículo. Trata-se de uma troca de favores entre mestrandos e doutorandos e, também, pode acontecer entre estes e seus orientadores. Que é o caso de colocar como coautor uma pessoa que deu contribuição mínima, ou muitas vezes nenhuma, para a conclusão do projeto ou artigo. É mais ou menos o trato de eu colocar o seu nome no meu artigo e você coloca o meu no seu. Assim, dobramos a inclusão de itens elencados no currículo. Como, também, pode ocorrer do orientador figurar na coautoria em artigos redigidos por mestrandos e doutorandos. Não se trata de que não possa haver artigos escritos a duas ou mais mãos. Contudo, a mera orientação prestada pelo professor não deveria ensejar referência autoral. E isto acaba gerando distorções no percurso da construção de uma dissertação ou tese. O orientador acaba cobrando um número de artigos exagerados ou acaba dando maior atenção àqueles pesquisadores que demonstram capacidade de maior produção de artigos, ainda que nem sempre isso configure em qualidade dos escritos.
Por fim, tudo isto vai desaguar na instauração de relações clientelistas no ambiente acadêmico. O clientelismo se trata daquela troca de favores, principalmente quando há alguém ocupando uma posição de poder em relação a outros. Isso faz parte da cultura nacional. Muito se escreveu sobre o clientelismo praticado pelos "coronéis" do nordeste, que davam alguns pequenos benefícios aos lavradores em troca do "voto de cabresto". Aliás, trata-se de conduta muito corrente na política nacional. Na universidade, o clientelismo vai gerar relações desiguais entre os alunos e entre estes e professores.
Numa palestra sobre iniciação científica, no curso de graduação, ouvi da palestrante que era preciso que nós, estudantes, colássemos em um professor que faz uma pesquisa que nos interessa, para cavarmos uma futura participação. Foi algo que soou muito mal aos ouvidos. Pois essa cultura leva ao famoso "puxa-saquismo". E eu sempre detestei esse tipo de coisa. Contudo, esta estratégia acaba dando certo e se formam aqueles "curriolas" em torno de determinados professores. E muitos professores acabam gostando. Já entrou no dna da vida universitária.
O maias trágico é que a academia identificou a existência do clientelismo, conceituou e criticou. Porém, reproduziu o mesmo modelo relacional dentro de seus muros.
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Outro problema é a sobreposição que o mercado teve em relação à vida acadêmica nas últimas décadas. Por algum tempo a academia lutou para ser um ambiente autônomo em relação aos sabores do mercado. E ainda luta hoje em dia. Contudo, as exigências do mercado foram penetrando e alterando as relações acadêmicas. Um exemplo claro é o setor de pesquisa super inchado de alunos a partir do momento que o mercado passou a exigir cada vez um leque maior de atividades de pós graduação para garantir chance de empregabilidade. Desta forma, houve uma grande corrida para os cursos de pós graduação. A pesquisa não era mais o fim em si mesmo, mas a obtenção do título. A publicação de artigos deixou de ser a mera consequência do resultado de um trabalho de anos de pesquisas para ser um imperativo para os estudantes e pesquisadores. Quanto maior o número de referências a artigos acadêmico publicados, melhor para o currículo Lattes. Neste sentido, a filósofa Marilena Chauí, ao criticar este modelo, disse com propriedade que "a vida não cabe no Lattes".
Desta conjuntura surgem fenômenos como a chamada coautoria fantasma. Que não se trata de ocorrência de atividade paranormal nos centros de pesquisa, mas da manifestação do 'jeitinho acadêmico" para rechear o currículo. Trata-se de uma troca de favores entre mestrandos e doutorandos e, também, pode acontecer entre estes e seus orientadores. Que é o caso de colocar como coautor uma pessoa que deu contribuição mínima, ou muitas vezes nenhuma, para a conclusão do projeto ou artigo. É mais ou menos o trato de eu colocar o seu nome no meu artigo e você coloca o meu no seu. Assim, dobramos a inclusão de itens elencados no currículo. Como, também, pode ocorrer do orientador figurar na coautoria em artigos redigidos por mestrandos e doutorandos. Não se trata de que não possa haver artigos escritos a duas ou mais mãos. Contudo, a mera orientação prestada pelo professor não deveria ensejar referência autoral. E isto acaba gerando distorções no percurso da construção de uma dissertação ou tese. O orientador acaba cobrando um número de artigos exagerados ou acaba dando maior atenção àqueles pesquisadores que demonstram capacidade de maior produção de artigos, ainda que nem sempre isso configure em qualidade dos escritos.
Por fim, tudo isto vai desaguar na instauração de relações clientelistas no ambiente acadêmico. O clientelismo se trata daquela troca de favores, principalmente quando há alguém ocupando uma posição de poder em relação a outros. Isso faz parte da cultura nacional. Muito se escreveu sobre o clientelismo praticado pelos "coronéis" do nordeste, que davam alguns pequenos benefícios aos lavradores em troca do "voto de cabresto". Aliás, trata-se de conduta muito corrente na política nacional. Na universidade, o clientelismo vai gerar relações desiguais entre os alunos e entre estes e professores.
Numa palestra sobre iniciação científica, no curso de graduação, ouvi da palestrante que era preciso que nós, estudantes, colássemos em um professor que faz uma pesquisa que nos interessa, para cavarmos uma futura participação. Foi algo que soou muito mal aos ouvidos. Pois essa cultura leva ao famoso "puxa-saquismo". E eu sempre detestei esse tipo de coisa. Contudo, esta estratégia acaba dando certo e se formam aqueles "curriolas" em torno de determinados professores. E muitos professores acabam gostando. Já entrou no dna da vida universitária.
O maias trágico é que a academia identificou a existência do clientelismo, conceituou e criticou. Porém, reproduziu o mesmo modelo relacional dentro de seus muros.
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