domingo, 9 de julho de 2017

Sacerdotisas, bordéis e o prostíbulo poético. O sexo e o erotismo pela história.


A temática sexual, com todas suas simbologias e representações, tem sido merecedora dos estudos de renomados pesquisadores no campo da sociologia, antropologia e da história. Para a história, a pesquisa das relações sexuais descortina uma série de contextos políticos, sociais e econômicos. Por isso, o sexo para a academia não se restringe à sensação de prazer. Vai muito além.

Diz-se que a prostituição constitui a profissão mais antiga do mundo. Provavelmente, também, a mais duradoura. Em tempos modernos, cujas novas tecnologias vão sepultando vários ofícios tradicionais, nada que foi oferecido pelos "sex shops" substituiu o complexo biopsíquico que só se atinge com a interação entre parceiros.

Na antiguidade oriental e clássica a prostituição estava ligada aos templos religiosos que adoravam os deuses relativos à fertilidade do solo. Profetizas e sacerdotes faziam sexo com seguidores como um ritual em honra ao deus ou deusa. Acreditava-se que o sexo nos templos, como forma de culto, era fundamental para que se realizasse uma colheita farta. O historiador grego Heródoto de Halicarnasso escreveu sobre a prostituição no interior do templo de Ishtar. Em Roma, a atividade foi reconhecida e regulamentada pelo Estado, que cobrava das "lobas", nome dado às prostitutas romanas, impostos pelos rendimentos percebidos da prostituição. Mesmo a Bíblia cita uma prostituta, Rahab, que vivia em Jericó, como peça importante que prestou ajuda aos israelitas na conquista da cidade.


( Portal do Templo de Ishtar - Babilônia )
Atualmente, há uma corrente de historiadores que pretendem revisar a narrativa que liga a prostituição ao sagrado na antiguidade. Fundamentam que tais documentos eram produzidos por cronistas que tentavam desmerecer a cultura  de povos estrangeiros. Porém, pode ser uma tentativa de reescrever a história estendendo a concepção moral atual para tempos pretéritos.

Com a consolidação da religião cristã se instituiu o conceito de pecado. A prostituição passou a estar entre as principais figuras no rol das atividades proibidas. Nem por isso a prostituição foi abolida. A atividade deixou de ocupar a ritualística dos templos pagãos e passou a ser comercializada. Mesmo com a disseminação da rígida moral cristã a prostituição continuou ocorrendo e sendo, inclusive, aceita por boa parte das sociedades. O senso comum acreditava, e ainda acredita, que a prostituição cumpre um papel social importante. As relações extraconjugais serviam às necessidades dos jovens, que seriam desestimulados à prática do estupro e da homossexualidade. Ainda em nosso tempo é comum a figura do pai que leva os filhos homens aos prostíbulos para sua iniciação sexual (aprender a ser homem). O próprio Santo Agostinho afirmava que "se a prostituição fosse abolida, a luxúria incessante destruiria a sociedade".

Com a revolução industrial, no período moderno, há o incremento da vida urbana. Grandes contingentes rurais são redirecionados às cidades para formar o exército de mão de obra para as fábricas. Neste período, as negociantes do sexo irão se instalar, na região urbana, em casas que ficaram conhecidas como bordéis. Aliás, a vida urbana foi a razão do fortalecimento da "indústria do entretenimento".  Várias atrações foram criadas para captar parte do salário dos proletários e dos rendimentos dos ricos donos de fábricas (principalmente do setor têxtil). Multiplicaram-se os teatros, cabarés, pistas de corrida de cavalos e, também, os bordéis. Aquelas casas voltadas para atender os senhores mais abastados eram ricamente decoradas e as moças vestidas com luxuoso erotismo. Alguns desses bordéis aproveitavam os dotes artísticos de algumas das moças e organizavam espetáculos para os clientes. Desses bordéis se derivou o famoso cabaré. E, por isso, a classe artística ficou, por muito tempo, mal afamada e associada à prostituição.

Em 1867 ficaram famosas na cidade do  Rio de Janeiro - Brasil - as prostitutas judias vindas do Leste Europeu e que foram conhecidas pelo apelido de "polacas". Essas moças eram recrutadas em diversos países da Europa Centro-Oriental por uma fundação que utilizava o nome de Associação Varsóvia. Por isso, essas moças tornaram-se conhecidas como "polacas". Elas chegaram para exercer o chamado "baixo meretrício"; ou seja, voltadas para atender à camada proletária de baixa renda. Por outro lado, as prostitutas ligadas aos luxuosos bordéis, atendendo à classe alta, eram conhecidas como as cocottes francesas. Desta forma, os termos polacas e francesas se referia ao perfil da clientela atendida e não necessariamente à nacionalidade das meninas.

Mesmo nos períodos de guerra a organização de bordéis não foram esquecidas. No período da segunda guerra mundial os japoneses dominavam toda a península coreana. O exército japonês usou coreanas escravizadas para formar bordeis militares que atendiam os oficiais e soldados. Eram chamadas pelos japoneses pela expressão "mulheres de conforto" e estima-se que foram mais de 200 mil coreanas utilizadas. Em 2013, Lee Ok-seon, uma das coreanas escravizadas nos bordéis de guerra japoneses foi entrevistada pela rede BBC e deu a seguinte declaração: "Somos muito velhas. Todos os anos morremos, uma por uma. Pode ser que a guerra tenha terminado, mas para nós continua". Também existem referências a bordéis criados dentro dos campos de concentração nazistas.

De uma forma ou de outra, as casas de prostituição atravessaram a história e chegaram até os nossos dias. Como já dito antes, a prostituição teve um diálogo próximo com a arte em dado momento. Não é à toa que vários artistas se expressaram retratando as moças trabalhadoras do sexo. Muitos pintores renomados retrataram as "mulheres da vida" em suas telas. Canções e poemas foram entoados enaltecendo damas dos bordéis e cabarés.

Curiosamente, hoje, na Espanha, existe um local denominado "prostíbulo poético". Trata-se de local decorado ao estilo de um bordel onde moças poetas se apresentam vestidas como prostitutas de luxo. Só que ao revés de sexo elas oferecem poemas declamados ao pé do ouvido dos frequentadores. A intenção é transcender o conceito de entregar o corpo. Lá se entrega a alma.

Abaixo vídeo sobre o prostíbulo poético:
https://www.youtube.com/watch?v=pIpqiO9Mp0c

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Algumas sugestões de leitura:

- Murphy, Emmett. História dos Grandes Bordéis do Mundo. Porto Alegre: Editora Artes e Ofícios, 1994.

- Chiland, C. O Sexo Conduz o Mundo. Rio de Janeiro. Companhia de Freud, 2005



2 comentários:

  1. Belo trabalho sobre o profissão, que é um serviço de primeira necessidade ao cidadão

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  2. Muito bom o texto... me inspira ainda mais em abordar esse tema no meu trabalho de conclusão de curso.

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