terça-feira, 29 de outubro de 2019

Olavo de Carvalho e suas pulgas.



A desorientação do governo federal em diversas pautas no primeiro ano de mandato tem implodido a sua base de sustentação. Isto não ocorre somente na base parlamentar. Atinge, também, apoiadores da classe artística e, principalmente, seu exército de youtubers.

Parte dessa base, capitaneada pelo guru Olavo de Carvalho, está se arregimentando no sentido de criar uma blindagem ao presidente. Outra parte, no entanto, passa a tentar descolar sua imagem em relação ao presidente. 

Neste movimento do tabuleiro, o segundo grupo passou a ser alvo dos ataques ferozes do primeiro. 

Em vídeo intitulado "discussões impossíveis", Olavo de Carvalho explica o porquê de sequer cogitar a hipótese de discutir qualquer destes assuntos com seus antigos seguidores de youtube. Explica que há uma barreira de nível intransponível entre ele e os youtubers. Que ele, Olavo, é um filósofo, enquanto seus antigos seguidores teriam que evoluir muito para que pudessem ser considerados seus meros alunos. Ao final do vídeo, se refere a estes youtubers como pulgas.

Olavo explica, ainda, que mesmo acadêmicos como Cortela e Pondé, entre outros, não possuem estatura cultural e filosófica para um embate. Que estes acadêmicos não são filósofos. Não construíram um sistema de pensamento filosófico próprio. Apenas estudaram, na faculdade, a obra filosófica de outros autores. Sendo assim, não são filósofos, apenas professores de filosofia. Dizendo que tais professores são apenas bacharéis. Neste ponto, parece que faz uma confusão entre os títulos de bacharelado e licenciatura.

Diz, também, que, no Brasil falar em filósofo constitui uma fraude, porquanto tais professores não elaboraram sistema filosófico próprio. Que seus livros não passam de literatura de autoajuda. 

Confesso que não conheço a obra escrita do Olavo de Carvalho. Nunca tive interesse, por conta de não guardar qualquer identidade com o discurso do mesmo. Por isso, não vou polemizar se ele é ou não filósofo. Contudo, vemos muitos acadêmicos não endossarem as palavras dele.

Pelo que é dito, Olavo nunca se formou na graduação de um curso superior. Porém, nesse ponto concordo que poderemos ter um autor, que tenha sistematizado um olhar específico para interpretar o mundo, sem que tenha frequentado a cátedra.

Então, fui verificar na rede quem convalida a obra de Olavo como participante do rol da produção filosófica mundial. Acabei num site que é citado pelo próprio Olavo, no vídeo supra mencionado, cujo domínio pertence ao próprio autor. Ora, o Olavo é a fonte validadora de sua própria produção literária. O que constitui uma impossibilidade absoluta. Observe-se que, na academia, um professor tem sua obra validada a partir da crítica efetuada pelos seus pares.

Para piorar o cenário, Olavo ainda se coloca como fonte validadora dos demais escritores na área. Pois declara, no vídeo, que os acadêmicos deviam apresentar seus trabalhos a ele para que pudesse avaliar se tinham escrito, ou não, uma obra que valesse o título.

Não sei se alguém, na academia, já enfrentou a questão sobre diferenciar  professor de filosofia de filósofo. Somente aquele reconhecido autor de um sistema filosófico próprio poderia ser chamado de filósofo? E o especialista que analisa as questões sob diversos sistemas criados por outros autores pode ser reconhecido como filósofo ? Um médico cirurgião que opera segundo os ensinamentos de outros médicos não pode realizar cirurgias ou ser reconhecido como médico ? E um advogado ?

Contudo, por amor ao debate, tomemos como certa a proposição de que professor de filosofia não é filósofo. Ainda assim, qual  impedimento de um debate entre ambos? Se o segundo interpreta o mundo segundo sua própria visão, o primeiro utiliza os sistemas filosóficos, já existentes, em que é especialista. Citemos, para tal, o jogo de xadrez. Não é necessário que o jogador tenha desenvolvido um sistema inovador para competir e ganhar.

Finalizando, gostaria de pontuar que se um professor de filosofia não é filósofo, o contrário também é verdadeiro. Alguém que não cursou a licenciatura não pode utilizar o título de professor. E o Olavo é conhecido com professor, ministra cursos e alega ter "alunos" como se professor fosse.

O problema é que a regulamentação da licenciatura é uma esculhambação. Qualquer um pode ganhar dinheiro como professor pela internet sem nunca ter pisado na graduação. Não é como na medicina, que se alguém resolve praticá-la de forma ilegítima poderá ser preso; ou na advocacia, cuja capacidade postulatória em juízo se dá apenas com o diploma e a aprovação no exame de ordem. 

Vídeo "discussões impossíveis" mencionado no texto:
https://www.youtube.com/watch?v=3ZvYZUdD6yc&t=573s

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